domingo, 13 de setembro de 2009

Para ler, se divertir e refletir

Hoje é domingo, dia de ressaca e de comer bolo da festa do dia anterior.. um calor danado e a vontade de postar alguma coisa, mas nao to nem um pouco a fim de falar sobre mim.

Este post é em homenagem a Arthur, que disse que nunca leu Clarice Lispector, e vou dar a ele e a voces a oportunidade de conhecer um pouco da obra dela... porque eu definitivamente me APAIXONEI por este conto.
Vou colocar um 'pequeno-grande' trecho do conto, que é enorme, e acho que não vai dar para postar tudo aqui [vai demorar anos até digitar tudo ou achar na internet e..]. Acho que vou ter que dividi-lo em posts, mas acho que vale a pena.
O conto se chama...

A MENSAGEM

"... A palavra angústia passou a tomar aquele tom que os outros usavam, e passou a ser um motivo de leve hostilidade entre ambos. Quando ele sofria, achava uma gafe ela falar em angústia. 'Eu já superei esta palavra', ele sempre superava tudo antes dela, só depois é que a moça o alcançava.
E aos poucos ela se cansou de ser aos olhos dele a única mulher angustiada. Apesar disso lhe conferir um caráter intelectual, ela também era alerta a essa espécie de equívocos. Pois ambos queriam, acima de tudo, ser autênticos. Ela, por exemplo, não queria erros nem mesmo a ser favor, queria a verdade, por pior que fosse. Aliás, às vezes tanto melhor se fosse 'por pior que fosse'. Sobretudo a moça já começara a não sentir prazer em ser condecorada com o título de homem ao menor sinal que apresentava de... ser uma pessoa. Ao mesmo tempo que isso a lisonjeava, ofendia um pouco: era como se ele se surpreendesse de ela ser capaz, exatamente por não julgá-la capaz. Embora, se ambos não tomassem cuidado, o fato dela ser mulher poderia de súbito vir á tona. Eles tomavam cuidado.
Mas, naturalmente, havia a confusão, a falta de possibilidade de explicação, e isso significava tempo que ia passando. Meses mesmo.
E apesar da hostilidade entre ambos se tornar gradativamente mais intensa, como mãos que estão perto e não se dão, eles não podiam se impedir de se procurar. E isso porque - se na boca dos outros chamá-los de 'jovens' lhes era uma injúria - entre ambos 'ser jovem' era o mútuo segredo, e a mesma desgraça irremediável. Eles não podiam deixar de se procurar porque, embora hostis - com o repúdio que seres de sexo diferente têm quando não se desejam -, embora hostis, eles acreditavam na sinceridade que cada um tinha, versus a grande mentira alheia. O coração ofendido de ambos não perdoava a mentira alheia. O coração ofenido de ambos não perdoava a mentira alheia. Eles eram sinceros. E, por não serem mesquinhos, passavam por cima do fato de terem muita facilidade para mentir - como se o que realmente importasse fosse apenas a sinceridade da imaginação. Assim continuaram a se procurar, vagamente orgulhosos de serem diferentes dos outros, tão diferentes a ponto de nem se amarem. Aqueles outros que nada faziam senão viver. Vagamente conscientes de que havia algo de falso em suas relações. Como se fossem homossexuais de sexo oposto, e impossibilitados de unir, em uma só, a desgraça de cada um."

Continuação no próximo post.

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