quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Os órgãos que eu sinto quando meus braços envolvem aquele fino pano que é pele. Órgãos que eu não sentia, e portanto eu não ligava, e portanto sequer existiam. Mas eles estão ali. São necessários. Estranhos. Bonitos. Perceptíveis.
Órgãos que só têm beleza nos olhos daqueles que vivem no hospital. Para nós, que gostamos da carne de fora, órgãos não têm beleza. Suas funções não têm beleza.
Órgãos que separam, armazenam as substâncias e protegem a sua carne.
Carne? Não há carne. Eu não vejo a sua carne, não não, porque ela é um pecado. E por ser pecado, faz questão de não nutrir a carne que também envolta os seus órgãos. No caso da carne, ela não deixa de existir porque não a vejo. Faço de conta que não a existe pelo fato de não a sentir. Sua carne é um pecado.
O pecado não está sobre os órgãos. Os órgãos têm o direito de mostrar que são puros, porque já que a carne se tornou um pecado, pelo menos os órgãos não estão impuros. O interior é mais limpo [embora digam o contrário].
Os meus braços envolvem o puro, os órgãos que são abraçados pela pele que é abraçada por mim. Mas os meus braços são puros, eles só abraçam aquilo que as articulações convém. O braço não pede muito, mas abrange muito. O braço é puro.
Mas as mãos não; se não fossem cheias daqueles inquetos e mesquinhos dedos, elas seriam como os braços. Mas não, as mãos são detalhistas e ambiciosas. Elas acham repugnante tocar o que lhes é diferente, e portanto não suportam tocar nos ógãos, pela sua viscosidade e moleza. Mãos são ambiciosas, carne que só aceita carne - mas onde está a carne?
As mãos são pecadoras também. O castigo delas é a constante e solitária presença ds órgãos. Procuram a carne, mas os órgãos não deixam.